A Copa do
Mundo acabou ontem e eu ainda estou imaginando a sensação do chileno que
acertou a trave no último pênalti antes de perder o jogo para o Brasil.
A trave é,
talvez, o mais humilhante dos erros porque não conta com o acerto de ninguém
para amenizar.
É o
milésimo de segundo quase imperceptível que separa o feito do não-feito – de
onde nasce o quase. E o quase é sempre muito brutal.
A torcida
em volta silencia para te observar cheia de expectativa e grito contido na
garganta. Você sabe que sabe fazer, sabe que merece fazer, sabe que é só se
concentrar um pouquinho e falar tudo certo na última etapa da entrevista do
emprego dos sonhos. Você sabe que o pior, quando havia mais de dois mil
currículos concorrendo, as probabilidades eram muito menores e você chegou até
o final. Você, a bola e o goleiro. Além da trave, que parece atrair o seu chute
certeiro e repelir com toda a força a bola para longe: agradecemos sua
participação. Havendo outra oportunidade, entramos em contato.
Aí você
fica tentando entender por que diabos chutou ali. E pensa em todas as
probabilidades e entende que esse é um estudo inútil, que só tenta confortar as
pessoas com a ilusão do previsível.
Chute na
trave, fim do jogo, bola pra frente.
No próximo
chute, você vai acertar. Vai entender o que fez de errado e já vai ter se
torturado até a última lágrima, imaginando o que teria sido se a bola tivesse
entrado. Você não vai acertar a trave de novo, e entra em campo com aliança no
dedo, pedido de casamento, cinco anos de investimento. Mais uma vez, você sabe
que pode, sabe que merece. É o fim da partida, não vai ter tempo de virar, são
45 do segundo tempo e você está novamente encarando o gol, a bola e o goleiro.
Além da trave. A data está marcada, a torcida ensaiada, você respira, se
prepara e chuta. E cria mais um quase para sua coleção.
E a vida
vai sendo feita de quases, embora tenham sempre te falado que seria feita de
feitos.
E as
partidas vão sendo decoradas com derrotas, embora te fizeram acreditar que
seriam vitórias.
E as
probabilidades, menores a cada vez, são também mais mentirosas e ilusórias
porque é possível, sim, acertar na trave sempre. Ou quase sempre – esperamos.
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