segunda-feira, 14 de julho de 2014

A trave e os quase-gols

A Copa do Mundo acabou ontem e eu ainda estou imaginando a sensação do chileno que acertou a trave no último pênalti antes de perder o jogo para o Brasil.
A trave é, talvez, o mais humilhante dos erros porque não conta com o acerto de ninguém para amenizar.
É o milésimo de segundo quase imperceptível que separa o feito do não-feito – de onde nasce o quase. E o quase é sempre muito brutal.

A torcida em volta silencia para te observar cheia de expectativa e grito contido na garganta. Você sabe que sabe fazer, sabe que merece fazer, sabe que é só se concentrar um pouquinho e falar tudo certo na última etapa da entrevista do emprego dos sonhos. Você sabe que o pior, quando havia mais de dois mil currículos concorrendo, as probabilidades eram muito menores e você chegou até o final. Você, a bola e o goleiro. Além da trave, que parece atrair o seu chute certeiro e repelir com toda a força a bola para longe: agradecemos sua participação. Havendo outra oportunidade, entramos em contato.

Aí você fica tentando entender por que diabos chutou ali. E pensa em todas as probabilidades e entende que esse é um estudo inútil, que só tenta confortar as pessoas com a ilusão do previsível.
Chute na trave, fim do jogo, bola pra frente.

No próximo chute, você vai acertar. Vai entender o que fez de errado e já vai ter se torturado até a última lágrima, imaginando o que teria sido se a bola tivesse entrado. Você não vai acertar a trave de novo, e entra em campo com aliança no dedo, pedido de casamento, cinco anos de investimento. Mais uma vez, você sabe que pode, sabe que merece. É o fim da partida, não vai ter tempo de virar, são 45 do segundo tempo e você está novamente encarando o gol, a bola e o goleiro. Além da trave. A data está marcada, a torcida ensaiada, você respira, se prepara e chuta. E cria mais um quase para sua coleção.

E a vida vai sendo feita de quases, embora tenham sempre te falado que seria feita de feitos.
E as partidas vão sendo decoradas com derrotas, embora te fizeram acreditar que seriam vitórias.

E as probabilidades, menores a cada vez, são também mais mentirosas e ilusórias porque é possível, sim, acertar na trave sempre. Ou quase sempre – esperamos.

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