apesar de termos feito tudo o que fizemos...

O que aconteceu com todos nós? - me pergunto.
Aqueles jovens que quebravam padrões e berravam os versos importados das favelas "eu só quero é ser feliz".  Os mesmos que estudaram e repudiaram a ditadura militar de uma ou duas gerações anteriores.  E aprenderam desde crianças que sexo casual é permitido, mas tem que ser com camisinha.

O que aconteceu com a gente?

Os menos fumantes e mais preocupados com saúde, porque agora, o mal do século se chama câncer.  Os que foram, talvez, os primeiros frutos da sabedoria freudiana e os que perderam os preconceitos e as falsas referências impostas por tanto tempo.

O que aconteceu com a gente?

Cheios de sonhos e de caras pintadas, sabedores de poesia, cordel e piada, o que aconteceu?
Vejo hoje todos nós ocupando os mesmos lugares dos que foram os antepassados.  Não serviu o grito da favela - era só mais um Silva.  Não adiantou a educação sexual, a aceitação homosexual, a política multilateral.  Ainda somos os mesmos e vivemos.  E vamos ao trabalho, entubados em uniformes fantasmagóricos que deixam, vez em outra, uma tatuagem aparecer.  Ou um peircing, um All Star disfarçado, resquícios do que poderíamos ser.

O que aconteceu com a gente, que agora repete exatamente tudo o que os outros fizeram?

Os mesmos trajes, as mesmas rotinas, as mesmas alianças.  Para onde foram as quebras de padrão que tanto preocuparam nossos pais em mil novecentos e oitenta e pouco?

De nada adiantaram.
E o sábio verso que embalou gerações anteriores ainda faz sentido: como os nossos pais.