Na minha cabeça

Eu saí de casa e descobri o que me faltava. Carga no meu Ipod. Eu precisava de música, rock and roll às 7 da manhã. É véspera de carnaval, eu sei. Mas meus ouvidos precisavam de algo um pouco mais pesado para acompanhar o que vai dentro do meu corpo. E samba... Samba é leve demais.

Um velho caindo aos pedaços entrou no ônibus sem poder contar com nenhuma clemência do motorista ou de qualquer passageiro. O que faz um velho destes sair de casa naquele horário para andar de ônibus? Deve estar indo jogar baralho. Me lembrei dos cotovelos da minha mãe, que já carregam marcas tão profundas feitas pelo tempo. Quando eu estiver caindo aos pedaços, saberei o que aquele velho estava indo fazer. A senhora no outro banco, mais conservada, também carrega traços fincados sem dó por toda a pele. E, não bastasse o peso da idade, carrega também uma cruz pesada no pescoço. Ela quer se salvar. Ela não sabe que ninguém está salvo. Ela ainda acredita no deus que vai julgá-la e tirá-la do sofrimento. Cadê esse deus, então?

Cadê a minha civilidade? O meu amor próprio, minha paz, meu bom senso? Estão todos sumidos. Devem estar onde deus está.

O velho caindo aos pedaços saltou na praia de Botafogo. Mas que diabos... Minha atenção era integralmente dele até dois PMs, daqueles bem cinza, algemarem um trombadinha. Ali, de manhã, em Botafogo, ele foi algemado e atrás havia uma mulher, daquelas bem loiras, chorando. Ele deve tê-la roubado e a PM apareceu, bem cinza. Combinando com o dia.
Agora o trombadinha iria à delegacia, ficar detido, até encherem o saco dele e o deixarem sair.
Até a polícia enche o saco das pessoas e as deixam ir embora. Essa é uma lição: a porta está sempre aberta, eu é que não sei.

O meu ponto chega na velocidade que o dia passa. Já são nove da manhã. Menos de 20 horas para o carnaval. Aí vai todo mundo se fantasiar – fadinhas escrotas sempre estarão em todos os blocos, brotando como moscas. E haverá também os piratas, os fantasiados de bonitos, de ricos, as colombinas, os de inteligente, os de feliz. E eu ainda não escolhi a minha... Mas devo me vestir de band-aid, para ver se passa.