quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Fazendo sentido

Eu gosto de sentir.

Não importa se é o soco no estômago, a dormência no coração ou o discreto cafuné nos cabelos que a vida nos oferece alternadamente. Eu gosto é de sentir na pele. Na alma, no olho, no dorso.

Das mais inusitadas sensações, nem tenho preferidas. Gosto de todas; calcinha que incomoda, cabelo molhado, botão da camisa aberto, torcicolo.

E gosto de sentir pena, frio em cinema, cinqüenta borboletas na barriga, pé no chão, mão na cintura, ciúme, medo em sinal, calor no natal, pêlos para cima, cabeça para baixo, machos, escrachos.

Ou aquela raiva de salgar a boca, ou o amor de cobrir o corpo, sentir vontade de escovar o dente, de comer uma coisa não existente, enxergar diferente, um ombro quente, cheiro de gente.

Sinto o que os outros sentem.



Ela corre suada no calçadão às sete da manhã. Ela é uma atleta e eu, no ônibus, também. Por poucos segundos apenas, até eu virar o executivo, de ternigravata enorme, mas não maior do que o seu próprio orgulho em vestí-lo. E sou o trocador, com unhas compridas que coçam confortavelmente os ouvidos.

Posso sentir o doce enjoado enquanto a menina enfia generosos pedaços de algodão-doce rosa na boca. Ganho saliva com o beijo do casal, rôo as unhas com o atraso alheio matinal, sinto a grávida indo fazer pré-natal.



E sinto minhas próprias linhas, com palavras carregadas, pensamentos inexplicáveis e essências egoístas que, estas sim, deixo só para mim.

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